Maria
A avó foi mãe. Foi colo. Foi canções de embalar. Foi troca de lençóis depois de um xixi maroto na cama. Foi sopa quente ao jantar. Foi coca-cola com mais água do que refrigerante. Foi café com leite e bolacha Maria à noitinha. Foi laranja, claro. Foi vinho às escondidas. Foi segredos confessados. Foi danças na casa-de-banho às tantas da madrugada. Foi alento. Foi classe. Foi saltos altos brancos que eu jurava que iria usar religiosamente quando tivesse a idade que tenho. Foi caracóis dourados. Foi cheiro a cabeleireiro. Foi creme hidratante Dove. Foi lágrima no hospital. Foi cuidado quando a perna partiu. Foi sorrisos e gargalhadas. Foi sestas depois do almoço. Foi oração. Foi sol quentinho até quando do lado de lá da janela fazia chuva. Foi outras infinitas coisas que a mente não me permite lembrar e o coração não me permite sentir, mas que a alma guarda para sempre, algures. Porque foi, antes de qualquer coisa, amor.
A avó já não faz anos há muitos anos. Fazia hoje. Quantos não sei, mas sei que já eram alguns. Tantos quantos buraquinhos tem o meu coração por a avó já não poder fazer mais anos.