Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

uma longa história

doida e doída

uma longa história

doida e doída

28 de Novembro, 2022

Maria

A avó foi mãe. Foi colo. Foi canções de embalar. Foi troca de lençóis depois de um xixi maroto na cama. Foi sopa quente ao jantar. Foi coca-cola com mais água do que refrigerante. Foi café com leite e bolacha Maria à noitinha. Foi laranja, claro. Foi vinho às escondidas. Foi segredos confessados. Foi danças na casa-de-banho às tantas da madrugada. Foi alento. Foi classe. Foi saltos altos brancos que eu jurava que iria usar religiosamente quando tivesse a idade que tenho. Foi caracóis dourados. Foi cheiro a cabeleireiro. Foi creme hidratante Dove. Foi lágrima no hospital. Foi cuidado quando a perna partiu. Foi sorrisos e gargalhadas. Foi sestas depois do almoço. Foi oração. Foi sol quentinho até quando do lado de lá da janela fazia chuva. Foi outras infinitas coisas que a mente não me permite lembrar e o coração não me permite sentir, mas que a alma guarda para sempre, algures. Porque foi, antes de qualquer coisa, amor.

 

A avó já não faz anos há muitos anos. Fazia hoje. Quantos não sei, mas sei que já eram alguns. Tantos quantos buraquinhos tem o meu coração por a avó já não poder fazer mais anos.

24 de Novembro, 2022

Notas aleatórias

Amanhã acordo às 5h30 porque não sei dizer não. Porque gosto de ajudar as pessoas. Porque gosto, sobretudo, de ajudar as minhas pessoas. Mas ando cansada demais. E o cansaço, como disse aqui há tempos, não é só físico. Antes fosse! A ser, ia para a cama mais cedo. Mas isso implicaria não desfrutar de vídeos engraçados, música ou leitura. Isso implicaria não me dedicar tempo. A ser, dormia uma manhã de domingo inteira. Ah, espera, não posso. Não posso porque se domingo é o meu dia de descanso, naturalmente há coisas para fazer e o que mais me apetece é sair para espairecer a cabeça e não ficar na cama como se fosse outra vez uma adolescente deprimida. Eu realmente perdi a minha adolescência para uma depressão e um namoro tóxico de anos que me roubou totalmente a identidade, não foi?

Não me queixo do cansaço, atenção. Quer dizer, queixo. É aquele cansaço bom, produtivo. Mas mói cá dentro.

 

Há três noites estive a rever fotos antigas. Antigas... Antes de tudo mudar. Antes de eu mudar. Fotos minhas sozinha e minhas com pessoas que também já foram um pouco minhas. Ou então nunca ninguém é verdadeiramente meu e eu sou apenas iludida. Provavelmente.

Guardo carinhosamente essas fotos numa pasta refundida no computador. Refundida, sim, para não correr o risco de tropeçar nelas sem querer. Assim só lá vou quando quero. E nessa noite eu quis.

Voltei ao passado e senti-me impotente. Fraca, meio dormente. Apetecia-me entrar por ali e pedir-me a mim mesma para não ir por certos caminhos. Sobretudo amorosos. Eu não sabia que por muito que o amor nos salve, as pessoas são a nossa ruína. Hoje sei. Mas também é verdade que foi por causa daquele rapaz, daquela relação e de todas as outras pequenas-não-tão-pequenas coisas que me fizeram que hoje sou como sou: cansada, chata, sensível demais, sim... Mas também vulnerável, carinhosa e alguém que não tem medo de ser "too much". A melhor forma de viver, apesar dos danos colaterais, é sem armadura.

 

Gostava de voltar a sentir-me assim, como naquele tempo antes do tempo passar. Gostava de ainda ter aquele corpo... Aquele bronze... Aquela pele lisa sem rugas... Aquele estilo. Gostava de não ter tanta bagagem como a que tenho hoje. Ou que pelo menos ela não fosse tão pesada. Porque é... Muito pesada. Gostava de ser compreendida. Gostava de não duvidar de toda a gente: estás a falar a sério ou a fazer-me de tonta? Gostava de me sentir amada. Gostava de me amar. Gostava de não estar sempre em guerra... Gostava de conhecer a paz.

15 de Novembro, 2022

Somos todos substituíveis

Hoje no trampo o patrão perguntou como estava a correr o meu outro trabalho. Sei que é uma questão de tempo até ele me dizer que agora que eu tenho algo estável vai dar oportunidade a outra pessoa que precise do dinheiro - e eu super compreendo isso. A questão é que nada está estável na minha vida e eu sinto-me uma verdadeira inútil.

 

Já não é altura de errar, mas eu erro. Até quando acho que estou a fazer as coisas bem estou a errar. É impressionante esta minha capacidade de ser um zero à esquerda. 

Dizem que todos erramos porque somos humanos, o que é muito bonito em teoria, mas na prática nenhuma empresa sobrevive de tentativas falhadas e boas intenções. Então, saber que sou parte do todo e que ainda assim não faço as coisas como era expectável, dá-me a ideia de que na realidade sou é um peso.

 

Também hoje me cruzei com as pessoas que me estão a substituir de um outro trampo que tive há uns anos. Dediquei-me tanto àquilo para um dia, quando encontrei um emprego aparentemente fixe, ser substituída com toda a leveza e facilidade do mundo.

Lá estavam eles a fazer o que durante anos fui eu a fazer, provavelmente a ter os mesmos pensamentos que eu tantas vezes tive e ainda assim a continuar como eu continuei.

Doeu. Pois claro que doeu. E depois o meu pensamento levou-me ao dia 31 de Outubro de 2021, quando liguei à antiga chefe para fazer uma questão e ela no fim me disse com uma naturalidade que até hoje não entendo: "ah, já agora... Amanhã já não precisas de vir. A dona Rosa está pronta para voltar. Hoje foi o teu último dia, depois combinamos para me entregares as chaves". Eu já sabia que estava apenas a fazer uma substituição temporária, mas ainda assim não consegui evitar sentir-me esborrachada, triste e indignada.

 

Somos todos substituíveis.

Uns mais do que outros.

Eu mais do que muitos.

13 de Novembro, 2022

Um domingo assim(-assim)

Ando super cansada e hoje, pela primeira vez em semanas, pude permitir-me levantar da cama mais tarde do que o normal. Como é óbvio não deu para aproveitar, pois às oito da manhã um qualquer cabrãozeco provavelmente embriagado passou pelo meu prédio a berrar.

 

A primeira coisa que fiz quando desisti de tentar dormir foi colocar os fones nos ouvidos. Comecei a ouvir músicas que gosto, daquelas que fazem qualquer um abanar o furico como se não houvesse amanhã. Pelo menos o meu foi bem abanado.

Depois saí de casa e deparei-me não só com a rua praticamente deserta, como também com um nevoeiro de meter medo.

Ao longo do dia comi mais chocolate do que é aceitável (mas ei, eu mereci e só Deus me pode julgar!). Também chorei desalmadamente porque me pus a ver vídeos tristes.

Acabei por eliminar o Instagram. Era algo no qual eu já pensava há algum tempo e no momento foi assim, como tirar um penso rápido, sem muita enrolação. Fiz e fiz, e está feito. Sinto que agora vou ressecar imenso pois estou oficialmente sem redes sociais e consequentemente sem vídeos engraçados para me dar doses de energia. Ainda coloquei a hipótese de ir para o TikTok, mas... Nah.

11 de Novembro, 2022

As laranjas do quintal

Fui criada pelos meus avós, o que significa, além de outras coisas, aprender a comer bem. Não que os pais não nos ensinem a comer bem, que pelo menos a minha mãe está constantemente a tentar convencer-me a comer espinafres, mas igual não é.


Sempre gostei de fruta. Acho que é dos melhores alimentos que se pode consumir.

Quando era menina adorava especialmente laranjas e a qualquer hora uma laranja caía bem. Mas não era a qualquer hora que podia comer laranjas, pois a minha avó dizia sempre que "laranja de manhã é ouro, à tarde é prata e à noite mata". Hoje tenho um carinho especial por esse ditado... Na altura tinha pânico puro. Questionava-me tantas vezes se de facto morreria ao comer uma laranja à noite. E criava planos para fugir da cama de madrugada só para experimentar. Escusado será dizer que nunca tive coragem.


O que é certo é que, anos mais tarde, quando a avó já cá não estava, eu quase quinei a comer uma laranja. E não, não era noite. A puta da laranja era docinha que só ela, bem suculenta, tão suculenta que assim que pus um gomo na boca o mesmo escorregou e ficou entalado na minha garganta. Eu não sabia se ria ou se chorava, e mesmo que soubesse não conseguia fazer nenhum dos dois porque estava demasiado ocupada a tentar desencravar o gomo da laranja para poder respirar de novo. Fiquei ali tanto tempo que as coisas já me fugiam da vista. E nisto, como se fosse a coisa mais natural do mundo e eu uma simples totó, o pedaço da laranja saiu por onde entrou. A situação foi tão trágica que durante uma década não comi laranjas.

 

Entretanto há quatro anos e meio contados comecei a trabalhar no sítio onde estou duas vezes por semana. Lá há árvores com laranjas que aos meus olhos sempre pareceram moedas de ouro. O cheiro ao passar por elas é das sensações mais refrescantes de sempre, e vê-las caídas no chão com pequenos bichinhos a aproveitá-las é, apesar de tudo, bom demais. Só que também faz o meu coração doer um pouquinho, pois traz-me mais saudades do que o habitual da minha avó.

 

Ps: voltei a comer laranjas, mas sinceramente prefiro clementinas. Afinal de contas os gomos são mais pequenos.

09 de Novembro, 2022

O frio que já se faz sentir

Não há volta a dar: sou do Outono. Gosto do aconchego das meias nos pés e do abraço de um robe vestido. Espero o ano inteiro pelas castanhas assadas (este ano não as posso comer, mas quando puder elas que se preparem) e só o seu cheiro pelas ruas já me faz andar nas nuvens. Sou fã do espetáculo que é ver folhas dançar pelo ar antes de cair na calçada (inclusive guardei a folha com que fiz uma pseudo sessão fotográfica no meu aniversário de há dois anos. E não, já não tenho as fotos, mas a folha continua ali no meu armário. Vá-se lá saber). Enfim, sou apaixonada por esta estação.

 

Já ando a dormir com uma manta nos pés. E já fui buscar um dos meus robes ao armário (a sério, se me querem fazer feliz ofereçam-me robes!). 

 

Com este tempo, perfeito perfeito era ir passear à praia. Apanhar o fim do dia e o início da noite. Rabiosque pousado na areia e olhos postos no céu: ver o sol se despedir e a lua entrar em cena. E uma boa companhia, talvez.

Na verdade, com qualquer tempo este seria um grande plano...

08 de Novembro, 2022

Mas este dia não acaba?

Eram 9h32 quando me fiz a mim mesma esta pergunta em pensamento. 

 

Acordei cansada e o cansaço não era só físico.

Apanhei uma molha porque quando saí de casa estava um sol que parecia dois, então calculei que se mantivesse assim e não levei chapéu comigo. 

Salvei um caracol (é uma cena minha) para três minutos a seguir estar a pisar outro. Ou se calhar o mesmo. Agora até me dá vontade de rir, mas isto não tem piada nenhuma.

A minha colega berrou por mim porque ninguém lhe abria a porta. Só me apeteceu gritar-lhe "calma miúda, eu estou com cólicas infernais, uma dor demoníaca nas costas, o cabrão do período não aparece, sinto-me cansada, triste e sozinha".

Percebi que num ápice passo de bestial a besta. E que se calhar o meu esforço não compensa, pois acabo sempre por estar errada em tudo.

 

Às vezes, muitas vezes, só queria voltar a 2019, quando as coisas estavam bem e faziam sentido (até mesmo quando não estavam nem faziam)...

06 de Novembro, 2022

Olá

2019 foi um ano bonito (pois foi o ano) em que decidi voltar à blogosfera. Tinha muitas aventuras para contar e, sem saber, muitas feridas para curar. Juntei o útil ao agradável e assim nasceu o Uma Longa História. Foi um lugar feliz onde me deixei tal como sou.

Depois a vida aconteceu, porque ela acontece sempre. Arrumei o blog numa gaveta como se arruma aquela camisola velha que nunca usamos mas que guardamos porque vai que. Posteriormente aluguei outras casas, que para mim é o que blogs são, e fui-me deixando por lá também; há pedaços de mim espalhados por aí. No entanto, sentia sempre que não fazia sentido e com o tempo percebi que por muito que pintasse as paredes, o meu lugar era outro.

 

Hoje sonhei que voltava. Foi estranho, mas fez-me acordar com o coração quentinho.

Hoje sonhei que voltava... E voltei.